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Boletim Informativo Nº 49
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INOCA: ISQUEMIA COM ARTÉRIAS CORONÁRIAS NÃO OBSTRUTIVAS

Drº Renato Sanchez Antonio

 

Uma grande proporção de pacientes (até 70%) submetidos à angiografia coronária por causa da angina e evidência de isquemia miocárdica (IM) não tem artérias coronárias obstrutivas, mas têm isquemia demonstrável. A INOCA (Ischaemia with Non-Obstructive Coronary Arteries) refere-se às coronárias epicárdicas com obstrução menor que 50% à angiografia, na qual a disfunção microvascular coronariana (DMC) e o vasoespasmo epicárdico (VSE), isoladamente ou em combinação com doença arterial coronariana (DAC), são mecanismos adjuvantes da IM. Representa cerca de 10% da incidência de infarto agudo do miocárdio (IAM), sendo mais frequente em mulheres jovens. A INOCA geralmente não é diagnosticada e, portanto, nenhuma terapia personalizada é prescrita para esses pacientes cujos sintomas são frequentemente descartados ou minimizados. Há relatos de pacientes com IAM sem obstrução significativa que apresentaram estresse físico e mental no período de 6-12 semanas após o evento, fato esse que propicia importante redução da qualidade de vida dos indivíduos no aspecto geral.

 

Há várias causas de IM com coronariografia normal. Primeiramente aventa-se a hipótese do espasmo coronariano, no qual ocorre, em curto período de tempo e com alta intensidade,
vasoconstrição das artérias epicárdicas levando à oclusão do vaso. Em pacientes com doença arterial coronariana não significativa pode haver aumento de troponinas. Dentre as causas de espasmo coronariano podem ser citadas cocaína e anfetamina, cardiomiopatia de Takotsubo; doenças como feocromocitoma e hipertireoidismo; pacientes com cateterismo normal, mas com vasorreatividade aumentada a estímulos simpáticos, com maior risco de evento cardiovascular. Outras causas: IAM por embolia paradoxal através do forame oval patente; aumento da demanda cardíaca; endocardite trombótica não bacteriana; IAM podendo representar a manifestação inicial de trombofilia na síndrome antifosfolípide. Deve-se incluir a dissecção espontânea de artéria coronariana, cuja consequência pode ser a obstrução luminal, que nem sempre é evidenciada em imagem angiográfica.


Diante dessa situação desafiadora, em que a coronariografia não estabelece o diagnóstico, a ressonância magnética do miocárdio tem sido considerada como opção de abordagem. O gadolíneo pode identificar áreas de lesão isquêmica reversível ou irreversível e o realce tardio revela a presença de fibrose relacionada ao IAM. As diretrizes do ESC (European Society of Cardiology) para síndrome coronariana crônica (SCC) de 2019 deram uma recomendação IIa para reserva de fluxo coronário (CFR: coronary flow reserve). A CFR é um método invasivo que permite uma medida integrada do fluxo através das grandes artérias epicárdicas e da microcirculação coronária, mas uma vez que doença obstrutiva grave das artérias epicárdicas seja descartada, a redução da CFR é um marcador de DMC. A CFR é a proporção do fluxo sanguíneo hiperêmico dividido pelo fluxo sanguíneo em repouso e pode ser calculada usando termodiluição ou velocidade de fluxo doppler. No geral, o valor prognóstico do CFR usou um valor de corte < 2,0. O índice de resistência microvascular (IMR: index of microcirculatory resistance) é calculado como o produto da pressão coronária distal na hiperemia máxima multiplicado pelo tempo de trânsito médio hiperêmico e o índice de resistência à velocidade do miocárdio hiperêmico (HMR: hyperaemic myocardial velocity resistance) é um índice baseado em doppler calculado dividindo-se a pressão intracoronária pela velocidade do fluxo hiperêmico. O IMR >= 25 e o HMR >= 1,9 são representativos da disfunção microvascular. Os pacientes com angina e artérias coronárias não obstruídas, HMR > 1,9 foi um preditor independente de dor torácica recorrente. A DAC obstrutiva limitante de fluxo pode ser avaliada usando reserva de fluxo fracionada (FFR: Fractional Flow Reserve), que é a razão entre a pressão coronária distal média e a pressão aórtica média na hiperemia máxima - FFR anormal é definido como <= 0,80. O uso de acetilcolina (ACH: acetylcholine) intracoronária para o diagnóstico de angina microvascular (AMV) e angina vasoespástica epicárdica (AVE) tem uma recomendação IIa pelas diretrizes do ESC para SCC de 2019 com base em sua segurança e eficácia demonstradas. Assim, nesta avaliação invasiva é possível determinar DMC independente do endotélio (CFR, IMR); DMC dependente do endotélio (resposta microvascular à ACH) e resposta vasoespástica (resposta da artéria epicárdica à ACH), bem como uma avaliação de estenoses de baixo grau (FFR). Os valores FFR > 0.8, CFR ≥ 2.0 e IMR < 25 representam ausência de DMC e após de teste de vasorreatividade com ACH com ausência ou redução ou do diâmetro < 90%, sem angina e falta de alterações isquêmicas de ECG interpreta-se como dor não cardíaca e as alterações opostas do teste possibilita diagnóstico de AVE. Os valores FFR > 0.8, CFR < 2.0 e IMR ≥ 25 representam presença de DMC e após de teste de vasorreatividade com ACH com ausência ou redução do diâmetro < 90%, sem angina e falta de alterações isquêmicas de ECG interpreta-se como AMV e o resultado oposto do teste possibilita diagnóstico de AMV e AVE.

 

Os fatores de risco tradicionais para DAC, hipertensão, dislipidemia, tabagismo e diabetes podem todos contribuir para a patologia da DMC, VSE e remodelamento estrutural da circulação. O manejo adequado da pressão arterial permite prevenir alterações microvasculares e reduzir a frequência e a intensidade dos sintomas anginosos. O uso de inibidores da enzima de conversão da angiotensina (IECA) ou bloqueadores de receptores da angiotensina (BRA) melhora a CFR na DMC e podem ser facilmente combinados com bloqueadores dos canais de cálcio (BCC) e betabloqueadores (BB). As estatinas são benéficas em pacientes com DAC não obstrutiva, e suas propriedades anti-inflamatórias também podem ser eficazes em pacientes com redução de CFR e espasmo vascular. A eficácia dos nitratos de ação curta pode variar e frequentemente precisa ser repetida. Os nitratos de ação prolongada são frequentemente ineficazes, mal tolerados e podem agravar os sintomas em pacientes com AMV devido a um efeito de roubo. Em pacientes com evidência de espasmo epicárdico ou microvascular após teste de ACH, os BCC devem ser considerados como terapia de primeira linha. Em pacientes com AVE grave, pode ser necessário administrar altas dosagens de BCC, ou uma combinação de não-dihidropiridínico (como o diltiazem) com dihidropiridínico (como o anlodipino). Em pacientes com AMV e CFR reduzida e / ou IMR aumentado (que pode refletir a remodelação arteriolar), são usados BB, BCC e IECA ou BRA. A terapia de primeira linha também pode ser combinada com o uso de ranolazina, um agente antianginoso que melhora o relaxamento do miócito e a complacência ventricular. Alguns pacientes com sintomas anginosos persistentes podem se beneficiar do uso de ivabradina, que diminui a frequência cardíaca tanto em repouso quanto durante o exercício, sem afetar a contratilidade ventricular esquerda. As diretrizes da SCC também recomendam a trimetazidina como medicamento de segunda linha em pacientes com SCC cujos sintomas não são adequadamente controlados por, ou que são intolerantes a, outros medicamentos para a angina. O uso de antidepressivos tricíclicos de baixa dosagem, como a imipramin pode ser útil para reduzir a intensidade dos sintomas.

 

Há poucos ensaios clínicos específicos; o tratamento é individualizado e baseado no provável mecanismo envolvido, além de medidas cardioprotetoras gerais.

Intracoronary Acetylcholine Provocation Testing
https://cima.aemps.es/cima/pdfs/es/ft/58154/FT_58154.pdf
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5091923/#__sec2title

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